quinta-feira, 17 de julho de 2008

A Curvatura e a Torção

Qualquer objeto em movimento descreve uma curva no espaço (pensemos, por exemplo, nas curvas que os pássaros ou as borboletas "traçam" durante os seus voos).

Existe uma "linguagem" matemática para descrever a forma das curvas no espaço?

Sim, é a "linguagem" da curvatura e, no caso tridimensional, da torção. Estas duas noções são bastante intuitivas e é possível recorrer a diversas situações do nosso quotidiano para as introduzir.

No caso das curvas planas podemos considerar a trajetória de um automóvel e observar a relação entre a sua curvatura e o comportamento do volante deste mesmo automóvel.
Imaginemo-nos a conduzir um automóvel.Se não virarmos o volante para a esquerda nem para a direita, qual será a sua trajetória?Obviamente que este segue sempre em linha reta.









Dizemos então que uma reta (ou um segmento de reta) não tem curvatura ou que tem curvatura zero (pois para mantermos essa trajetória não curvamos o volante para nenhum dos lados).Suponhamos agora que viramos o volante para a esquerda e que o mantemos sempre nessa posição. Qual será a trajetória do nosso automóvel?Ao fim de algum tempo estaremos de

novo na posição inicial, depois de percorrermos uma trajetória circular.












Dizemos então que a circunferência tem curvatura constante (mantemos essa trajetória se "curvarmos" sempre o mesmo).E se tivessemos inicialmente rodado o volante ainda mais para a esquerda do que na situação anterior? Tal como no caso anterior, teríamos novamente percorrido uma trajetória circular.Mas esta nova circunferência teria raio menor. Como é necessário "curvar" mais para percorrer esta nova trajetória circular, dizemos que a segunda circunferência tem curvatura maior que a primeira.













Se o nosso automóvel tivesse virado à direita, teríamos uma situação perfeitamente análoga e as circunferências seriam iguais às anteriores.Uma vez que as circunferências percorridas são iguais (quer se "curve" para a esquerda, quer se "curve" para a direita), não há razão para considerar que a intensidade da curvatura é diferente nas duas situações.
Mas então como é que podemos distinguir estas duas situações?
A solução é dar o mesmo valor, em módulo, para a curvatura nos dois casos, mas definir que virar para um dos lados é positivo e para o outro é negativo.

Em Matemática, convenciona-se que as curvas que "curvam" para a esquerda têm curvatura positiva enquanto que as que "curvam" para a direita têm curvatura negativa.
Resumindo, o sinal da curvatura representa o lado para onde "se curva" enquanto que o seu módulo representa a intensidade com que "se curva".Verificam-se ainda as seguintes propriedades:
  1. As retas têm curvatura zero.
  2. As circunferências têm curvatura constante.
  3. As circunferências percorridas no sentido anti-horário (contrário ao movimento dos ponteiros do relógio) têm curvatura positiva.
  4. As circunferências percorridas no sentido horário têm curvatura negativa.
  5. Quanto menor for o raio da circunferência, maior será o valor da sua curvatura (em módulo).
No caso das curvas tridimensionais, um exemplo natural é o avião e as suas possíveis trajetórias. O avião efetua os mesmos movimentos que um automóvel - por exemplo, quando está na pista de aterragem, o avião pode movimentar-se em linha reta ou em círculos como se fosse um carro normal - aos quais são acrescentados, grosso modo, os movimentos de subida e descida para que este consiga efetivamente voar.

Analisemos em primeiro lugar a situação em que o avião se mantém sempre no mesmo plano como, por exemplo, na pista de aterragem. Nesta situação, todas as propriedades estudadas anteriormente continuam válidas como, por exemplo:
  • as retas têm curvatura zero;
  • as circunferências têm curvatura constante.

Uma reta e uma circunferência são ambas curvas planas, mas existe uma grande diferença entre estes dois tipos de curvas: uma circunferência apenas está contida num plano (e em mais nenhum) enquanto que uma reta está contida numa infinidade deles.

Uma vez que a circunferência está contida num único plano (nunca se "torcendo" para tentar fugir a esse plano), diz-se, em Matemática, que não tem torção ou que tem torção nula. Apesar de a reta também ser uma curva plana, esta curva não tem torção definida - devido à sua propriedade de estar contida numa infinidade de planos.









Imaginemos um avião num movimento ascendente constante e suponhamos ainda que viramos o seu "manche" para a esquerda e que o mantemos sempre fixo. Qual será a trajecória deste avião?



O avião vai percorrer uma trajetória helicoidal.
Como o "manche" está sempre fixo para a esquerda, dizemos que esta curva tem curvatura constante não nula. Como o movimento ascendente é constante, diz-se também que esta curva tem torção constante não nula (note-se que a hélice não é uma curva plana).

A curvatura mede, em cada ponto, o quão rapidamente a curva se afasta da reta tangente à curva nesse mesmo ponto.

A torção mede, em cada ponto, o quão rapidamente a curva se afasta do plano osculador à curva nesse mesmo ponto.Mas será que a curvatura e a torção são medidas suficientes para definir a forma de uma curva? De fato, existe um resultado similar ao Teorema Fundamental das Curvas Planas no caso tridimensional, mas é necessário considerar um pressuposto adicional em relação à função curvatura, que é o fato de esta ter que ser sempre maior que zero. Esta propriedade da função curvatura é essencial para se obter a unicidade da curva.

Tem-se então o Teorema Fundamental das Curvas, que garante que se duas curvas tiverem a mesma função curvatura (com k>0) e a mesma função torção, existe um movimento rígido de 3 que transforma uma curva na outra.

Isto significa que é possível transformar qualquer uma das curvas na outra sem recorrer a deformações, ou seja, utilizando apenas translações e rotações.

Em futuros post's veremos um pouco mais sobre essa e outras magníficas propriedades que as curvas possuem... =]

Nenhum comentário: